domingo, janeiro 30, 2011

Crônica 15


(foto: web - "Revista Cosmopolitan - Lady Gaga", 2010)

LOIRA FATAL

Arlene comenta com Glória por celular – Menina, você viu a nova novela das oito que estreou ontem? Com aquela atriz... Como é mesmo o nome dela? A que faz a personagem principal... Ah! Esqueci... Mas, viu o cabelo dela? Eu amei. Acho que vou ao salão amanhã pintar o meu igual.

Glória, assustada com a amiga, alerta – Você tá brincando... Você tá doida! É muito exagerado! Uma cor muito clara e artificial, quase branco! Parece até as loiras platinadas do cinema antigo! Aliás, a trama da tal novela se passa nos anos 40, você sabia? Era outra época, outro mundo. Pense bem!

Arlene, irredutível, responde - Tô nem aí. Tá na novela, tá na moda. E eu, como só ando na moda, vou pintar sim! E agora tenho que ir ao shopping comprar umas coisinhas lá pra casa. Beijinhos!

No dia seguinte, dia dos namorados, Arlene acorda bem cedo e vai correndo ao salão de beleza, onde já tinha hora marcada, para executar a sua empreitada estética. Naquela noite, queria fazer uma surpresa pra seu novo namorado Asdrúbal.

No salão, Arlene dá as instruções a Rita, sua cabeleireira, sobre o novo corte e a nova cor para os seus cabelos. Rita estranha o inabitual radicalismo de sua cliente, que sempre manteve a sobriedade e a constância no que diz respeito à sua aparência. Ela sabia que Arlene amava seus cabelos negros, lisos e longos... E agora queria transformá-los em loiros, cacheados e curtos? Mesmo achando uma loucura, segue às ordens recebidas.

Arlene, já com seus cabelos lavados, senta-se noutra cadeira para iniciar a sua transformação. Rita entrega-lhe uma revista, dessas de fofoca dos bastidores de televisão e cinema, para entretê-la enquanto se empenha no esmerado trabalho.

Arlene folheia a revista, distraidamente, mais para ocupar as suas mãos do que para ler o conteúdo publicado. Estava ansiosa por causa da decisão que tomara. De repente, passa uma vista mais apurada num artigo sobre cinema, intitulado: “Loira Fatal e a Fatalidade”. Intrigada, passa a lê-lo atentamente.

A matéria, longa e nostálgica, abordava infortúnios ocorridos com diversas atrizes loiras do mundo cinematográfico, em cada uma das décadas do século XX. Reproduzindo um trecho do artigo:

“... Coincidência, ou não, várias atrizes do cinema, desde a era muda até as últimas décadas, que personificaram loiras (algumas do tipo fatal), tiveram suas vidas interrompidas tragicamente, seja por doença, acidente, homicídio ou suicídio. Elas, que alcançaram rapidamente o sucesso, não viveram o suficiente para saborear os louros da fama. Por que a fatalidade como sina dessas belas loiras? Será que tanto exibicionismo atraiu maus fluídos para elas? Comprovando esta lastimável coincidência do destino, segue abaixo a lista com os dados dessas estrelas:

ANO DO ÓBITO / NOME / IDADE NO ÓBITO / CAUSA DO ÓBITO

• 1935 – Thelma Todd (aos 30 anos - intoxicação com gás);
• 1937 – Jean Harlow (aos 26 anos - nefrite e septicemia);
• 1942 – Carole Lombard (aos 33 anos - acidente aéreo);
• 1947 – Grace Moore (aos 48 anos - acidente aéreo);
• 1948 – Carole Landis (aos 29 anos - overdose de barbitúricos);
• 1948 – Elissa Landi (43 anos - câncer);
• 1950 – Kay Kendall (aos 33 anos - câncer);
• 1958 – Helen Twelvetrees (aos 49 anos - overdose de barbitúricos);
• 1961 – Belinda Lee (aos 25 anos - acidente automobilístico);
• 1962 – Marilyn Monroe (aos 36 anos - overdose de barbitúricos);
• 1965 – Judy Holliday (aos 43 anos - câncer);
• 1967 – Jayne Mansfield (aos 34 anos - acidente automobilístico);
• 1970 – Inger Stevens (aos 35 anos - overdose de barbitúricos);
• 1972 – Marilyn Maxwell (aos 50 anos - infarto);
• 1973 – Verônica Lake (aos 53 anos - hepatite);
• 1973 – Betty Grable (aos 56 anos - câncer);
• 1975 – Mary Ure (aos 42 anos - ingestão de barbitúricos e álcool);
• 1976 – Barbara Nichols (aos 47 anos - cirrose hepática);
• 1977 – Diana Hyland (aos 41 anos - câncer);
• 1977 – Jean Hagen (aos 54 anos - câncer);
• 1979 – Jean Seberg (aos 40 anos - overdose de barbitúricos);
• 1980 – Rachel Roberts (aos 53 anos - overdose de barbitúricos);
• 1981 – Gloria Grahame (aos 57 anos - câncer);
• 1982 – Grace Kelly (aos 52 anos - acidente automobilístico);
• 1984 – Diana Dors (aos 52 anos de câncer);
• 1984 – Peggy Ann Garner (aos 52 anos - câncer);
• 1990 – Jill Ireland (aos 54 anos - câncer);
• 1991 – Lee Remick (aos 55 anos - câncer);
• 1992 – Sandy Dennis (aos 54 anos - câncer);
• 1992 – Diane Varsi (aos 54 anos - problemas respiratórios).”


Arlene, impressionada com a tenebrosa história que acabara de ler, balbucia – Coitadas... Seria praga mesmo?!

Rita, sem entender direito, pergunta – Disse algo, Senhora?

Arlene responde envergonhada – Nada não, bobagem.

A essa altura, as madeixas de Arlene já reluziam como ouro... Ouro branco. Tornara-se uma loira platinada, tal qual as starlets relacionadas no artigo. Quando vê o resultado no espelho, sente um calafrio e até pensa em mandar Rita trazer de volta a sua cabeleira negra, mas rapidamente cai na real e diz, ainda fitando-se no espelho – Que tolice a minha! Coisa de gente supersticiosa. Eu tô muito linda!

Concluído o trabalho, Rita, toda orgulhosa, pergunta a sua cliente – E aí, Dona Arlene? Gostou do novo visual? Fiz o que pude, e acho que atendi aos seus anseios.

Ainda estranhando a sua nova imagem, Arlene, com um sorrisinho meio forçado, elogia – Rita, você está de parabéns, tá ótimo! - Dá um suspiro, levanta-se, paga a conta e sai apressada, assustada... Quase arrependida.

Já na calçada, enquanto caminha em direção à sua casa, a duas quadras do salão, seu celular toca. Era Asdrúbal. Mesmo ofegante, Arlene atende-o – Alô? Oi, amor! Tudo bem? O que houve pra você tá me ligando uma hora dessas? Tá doente? Febre! Mas e o nosso encontro de hoje à noite? E a nossa viagem de final de semana? Tenho até uma surpresinha pra você...

Enquanto falava e ria ao celular para descontrair o namorado, que parecia estar bem triste do outro lado da linha, Arlene vê um carro conversível passar na rua logo ali na sua frente. O carro era idêntico ao do Asdrúbal, e o motorista, que também falava ao celular, se parecia muito com o ele.

Arlene pensa em voz alta e acompanha com os olhos o carro que vai se afastando – Mas o rapaz está abraçado com uma mulher loira, e o meu Asdrúbal está... Doente em casa... Então!?... É o meu Asdrúbal!

Atônita, Arlene solta o celular que se espatifa no chão. Suando frio, fervendo de raiva, esbraveja chorando - Aquela loira vagabunda roubou o meu namorado! Raça imprestável de mulher! Eu abomino essas loiras!

Depois do desabafo, se dá conta de que agora fazia parte daquele grupo que ela dizia detestar. Dá um suspiro forte e volta em marcha pro salão.

Surpresa com o imediato retorno de sua cliente, Rita indaga – O que houve, Dona Arlene? Esqueceu alguma coisa?

Arlene descarrega prontamente – Sim, me esqueci de mim mesma... Quero os meus cabelos pretos de volta... e a minha sorte também!

(texto: Mario Gordilho)

Música: "Cara de Pau" - Ana e Angela (1978)

2 comentários:

Anônimo disse...

OI, MÁRCIO.
MUITO DIVERTIDA A CRÔNICA.
REALMENTE INSTIGANTE VÁRIAS BELDADES LOIRAS TEREM A VIDA TÃO TRÁGICA...
ABRAÇÃO.
"SÉRGIO" DE BRASÍLIA

MARIO GORDILHO disse...

Valeu, Sérgio!

Abração

Mário